O Músico foi seu primeiro romance originalmente escrito em inglês. O que a fez optar por isso neste trabalho?
Quando as comunidades indígenas foram violentamente desrespeitadas, decidi criar uma narrativa na qual um jovem músico contemporâneo, excepcionalmente bem sucedido, só encontra a paz ao valorizar e ouvir os ensinamentos dos povos das florestas. Meu desejo era compartilhar, por meio de uma fábula moderna, a relevância da visão ancestral guarani naturalmente ecológica.
A Mitologia brasileira ocupa grande parte de O Músico. O que a levou até estes mitos?
Meu pai gostava de dizer que “quando a insensatez humana provocar a catástrofe planetária, os povos indígenas irão assumir a liderança porque serão os únicos a conhecer os caminhos das estrelas”.
Ao longo de todos os anos que passei ouvindo narrativas de autores indígenas do Brasil, percebi que suas lendas e mitos focam na aceitação mútua, inclusão, e uma conexão profunda com a Natureza. Thomas é um artista sensível que escuta o chamado da floresta sem saber do que se trata. Sua vocação secreta será captada pela linda Marlui quebrando o paradigma atual que associa a fama jovem à morte prematura.
De modo a tecer a trama de mitos ancestrais na composição de personagens urbanos, optei por contar as histórias segundo cinco pontos de vista diferentes, ao mesmo tempo tentando manter o ritmo de intenso suspense.
Que tipo de pesquisa foi feita para a escrita deste romance?
Meu pai, Luiz, era um grande admirador das tradições indígenas. Quando menino ele fez amizade com o pessoal da comunidade Guarani em São Vicente, na baixada santista. Ele cresceu profundamente influenciado pelos ensinamentos que recebeu na época. Adulto, ele passou a viajar para a comunidade xavante todos os anos. Vivíamos em São Paulo e o trajeto de carro era bem longo. Na volta, ele me contava sobre as experiências, reflexões e seu aprendizado contínuo. Herdei sua visão de mundo. Minha própria amizade com Daniel Munduruku, Olívio Jekupé e a comunidade guarani de Parelheiros já data de quase 30 anos.
Em 2017 o músico Estas Tonne veio ao Brasil. Ele tocou na comunidade guarani e conversou com o xamã. Escutando o bate papo entre eles, fiquei fascinada com a cura pela música, segundo a visão Guarani. O capítulo intitulado Cinco Cordas foi inspirado numa experiência real, na casa de reza. Este é seu primeiro livro para leitores adultos após uma carreira de sucesso escrevendo para crianças e adolescentes. Como a escrita desse romance difere das outras?
No Brasil, publiquei tanto livros infantis quanto romances para jovens adultos. Lenora, meu primeiro romance gótico foi inspirado na escrita de Edgard Allan Poe, mas a narrativa se situa numa praia de Florianópolis. Quando apresentei o original de O Músico para a equipe da editora Koehler, pensava ter escrito um livro para jovens adultos, uma obra de suspense com um cenário brasileiro. Contudo, talvez pela opção que fiz por cinco narradores diferentes, o reconto de mitos e ensinamentos guaranis em tempo contemporâneo, os editores acharam que o livro não deveria ser limitado apenas a um tipo de leitor. Embora eu adore escrever para jovens, considerei um elogio o fato de ter criado uma narrativa que também incluía leitores adultos.
O que você gostaria que os leitores levassem consigo após o contato com Thomas, Marlui e os outros personagens?
Poesia, beleza e paz só podem ser captados por olhos que sabem “ver”. Assim como na floresta a beleza deriva da diversidade, cada personagem tem a função de compartilhar de um novo horizonte de modo a alargar as paisagens internas de cada pessoa. O que é um final feliz? Às vezes, perguntas significam mais do que respostas. A vida é um enigma constante que pode nos conduzir a cenários muito surpreendentes.